Novidade foi recebida pelos
habitantes com surpresa; livro sobre o Zeppelin será lançado nesta sexta-feira
Nesta sexta-feira é celebrado o
85º aniversário da chegada do Graf Zeppelin ao Recife. O acontecimento
registrou um momento de mudanças e novidades para a cidade e para o estado de
Pernambuco como um todo. A seguir, reproduzimos um artigo do jornalista e
historiador Leonardo Dantas Silva sobre o Graf Zeppelin e tudo o que ele
representou para a sociedade da época.
Graf Zeppelin em 1930. (Foto: Reprodução/Recife de Antigamente) |
No próximo dia 22 deste mês de
maio transcorre o 85º aniversário da chegada do primeiro Graf Zeppelin ao
Recife, inaugurando linha direta, bimestral, com a Europa, fazendo a rota
Friedrischafen-Sevilha-Rio de Janeiro. Surgia assim uma nova época nos tempos
do Recife, trazendo modas e novidades, novos hábitos e costumes que vieram
anteceder a segunda Grande Guerra. Pelo noticiário, que se depreende do Diario
de Pernambuco, do dia 23 de maio de 1930, e depoimentos dos que assistiram e
documentaram, a exemplo do compositor Raul Valença que chegou a fazer um filme,
foi uma verdadeira revolução na cidade, quando da chegada daquele dirigível
após 59 horas de viagem:
Capa do Diario de Pernambuco de 25/05/1930. (Foto: Cedoc/DP/D.A Press) |
"Um vivo interesse se
desenhava em todos os semblantes entorno desse acontecimento destinado a marcar
uma data inesquecível na vida da cidade. [...] às 18 horas e 35 minutos o
dirigível foi avistado no Recife e logo entrou a tocar, para divulgar a boa
nova, o carrilhão do Diario de Pernambuco, cujos terraços estavam ocupados por
famílias do nosso escol social. [...] O Diario de Pernambuco, em sua edição do
dia seguinte, às 16 horas, era já compacta a multidão de curiosos que se
empilhavam nas torres das igrejas e até nos tetos das casas. – inclusive nos
terraços dos edifícios mais altos: Moinho Recife, Palácio da Justiça, Diario de
Pernambuco, Hotel Central, etc. No mais alto da cúpula do Palácio da Justiça, em
verdadeiro esporte de equilíbrio, agrupavam-se algumas dezenas de pessoas. O
terraço desta folha, já às 17 horas, estava repleto de numerosa e compacta
assistência. [...] – Chegarei pouco depois do por do sol, foi a mensagem do
comandante Eckener. [...] É ele! É ele! É uma estrela!.... , gritava o povo.
Mas a dúvida em breve dissipou-se. Alguns instantes mais e a sombra branca do
imenso pássaro aéreo começou a surgir e a crescer. Já eram então visíveis os
dois focos de proa e popa marcando o vulto imenso que desfilava dentre as
nuvens. Precisamente às dezoito e meia passava o Graf Zeppelin, mais baixo
acerca de trezentos metros de altura, sobre a torre da Catedral de Olinda.... E
logo começou-se a ouvir o surdo rugido das suas hélices possantes... Mas pode mencionar-se
o emocionante espetáculo da nave imensa a deslizar dentro da noite, sobre a
cidade, rumando do norte ao poente, numa grande curva, direto ao Campo do
Jiquiá, como se conhecesse o caminho; como uma ave retardatária que se torna ao
pouso, mil vezes demandado".
O dirigível estava sob o comando
do Comandante Hugo Eckener, que, juntamente com o infante Dom Affonso de
Espanha, foi saudado pelo então secretário particular do governador Estácio
Coimbra, Gilberto de Mello Freyre, após a sua amarração no Campo Tempos do
Zeppelin, na sua linha regular ligando a Europa ao Brasil e Argentina,
relembrados pelos mais antigos e assim descritos na poética de Ascenso
Ferreira:
– Apontou!
– Parece uma baleia se movendo no
mar!
– Parece um navio avoando nos
ares!
– Credo, isso é invento do cão!
– Ó coisa bonita danada!
– Viva seu Zé Pelin!
– Vivôôô!
– Deutschland über alles! Chopp! Chopp!
Chopp!
– Atracou!
O Graf Zeppelin realizou 63
viagens unindo o Recife à Europa. Em 1936, veio a ser substituído por outro
dirigível, o Hindenburg, que possuía 804 pés de comprimento; 76 pés menos do
que o transatlântico Titanic e 228 pés maior do que um boeing 747. Este último
realizou sete viagens ao Brasil, antes do acidente que o destruiu, em 1937, ao
pousar em Lakehurst, no estado norte- americano de New Jersey. – Um pé
correspondente a 12 polegadas e equivalente, no sistema métrico decimal, a
aprox. 30,48 cm.
As primeiras experiências com
sucesso no campo da aeronáutica no Recife foram realizadas em 1862 por Július
Buislay, da companhia francesa de Acrobatas, que subindo num balão fazia
acrobacias no Pátio do Teatro Santo Antônio, na Rua das Florentinas (trecho
hoje ocupado pela Avenida Dantas Barreto, entre a Praça da República e a Rua
Siqueira Campos) segundo noticia o Jornal do Recife, em sua edição de 26 de
outubro:
A nossa população presenciou
ontem um espetáculo inteiramente novo para ela. Foi a ascensão do artista
acrobático Júlio Burlay, que conforme havia feito comunicado, subiu as regiões
etéreas arrebatado pelo seu Montgolfier. Uma multidão imensa apinhada no Campo
das Princesas saudou o intrépido aeronauta com gritos de prolongados vivas e
aplausos. Eram cerca de 6 horas e um quarto quando o balão ergueu-se
suavemente, buscando o lado sul, impelido pelo vento norte; não estando
completamente cheio começou logo a baixar, indo depois o corajoso viajante cair
nas proximidades dos Coelhos. Durante o trajeto o excelente artista fez
diversas evoluções sobre o seu trapézio, oferecendo aos olhos da população
admirada a realização de um espetáculo para o qual, há cerca de um ano, teria
sido convidado...
A temporada de balonismo do
francês Július Buislay vem a ser noticiada na edição do Jornal do Recife de 3
de novembro – “ o artista fez anteontem a sua segunda ascensão aerostática,
indo aterrissar sobre uma casa térrea na Rua Velha, de onde o trouxe para o
Teatro da Rua das Florentinas uma multidão imensa de pessoas”. Na semana
seguinte, 11 de novembro, o mesmo jornal informa que na sua terceira tentativa,
“o balão pouco cheio não subiu alto, indo cair no quintal de uma casa da Rua
dos Martírios”.
Outra proeza foi feita em sete de
outubro de 1906, por José Pereira da Luz (Zé da Luz), que subindo num
aeróstato, na antiga Rua do Sebo, hoje Barão de São Borja, foi cair em Tejipió.
A primeira travessia aérea do
Atlântico Sul veio a ser realizada pelos aviadores portugueses Gago Coutinho e
Sacadura Cabral, que saídos de Lisboa a bordo do hidroavião “Lusitânia”, em 3
de março de 1922, pousaram na bacia do Capibaribe em 5 de junho daquele ano.
Para comemorar o feito, fez-se erguer um grande monumento em mármore aos dois
aviadores portugueses, esculpido por “Santos e Simões – estatuários” e foi
ofertado pelos portugueses residentes em Pernambuco. A sua inauguração
aconteceu, em 1927, sendo instalado no Cais Martins de Barros.
Os primeiros brasileiros a cruzar
o Atlântico Sul foram João Ribeiro de Barros (comandante), Newton Braga, João
Negrão e Vasco Cinqüini, que, a bordo do hidroavião Jahú, fizeram o voo
histórico Gênova-São Paulo, escalando no Recife em cinco de junho de 1927,
amerissando na bacia do porto, sendo recebidos com grandes festas. No mesmo
ano, comércio da Encruzilhada, a fim de assinalar o feito, mandou erguer uma
coluna de oito metros de altura, encimada por uma águia pousada sobre o globo
terrestre, com a inscrição: “Raid Gênova-Santos. À heroica tripulação do Jahú,
homenagem do povo da Encruzilhada. Recife, 25 de setembro de 1927”.¹
A correspondência aérea entre o
Recife, o Rio de Janeiro e Buenos Aires, veio a ter início a 7 de março de
1927, através da Companhia Latecoére, depois denominada de Aeropostale, que
veio a ser o embrião da Air France. Na bacia do Pina-Santa Rita passaram também
a amerissar os hidroaviões da Condor-Lufhansa e da Panair-Panamerican.
O primeiro aeroporto do Recife só
veio a surgir, anos depois com os aviões utilizando a pista de areia do campo
do Ibura, particularmente os pertencentes à aviação militar, ao Correio Aéreo
Nacional e a LATI – Linhas Aéreas Transcontinentais Italianas, a “Ala Litoria”.
Esta última veio contribuir para a construção de uma pista em concreto, a fim
de pousar os trimotores Savoia-Marchetti-83, na ligação Roma-Rio de Janeiro.
Com a criação da Força Aérea
Brasileira, fez-se necessário a implantação da Base Aérea do Recife, por força
do Decreto n.º 3459, de 24 de julho de 1941, seguindo-se da 2ª Zona Aérea, em
25 de outubro de 1941, formando assim um complexo militar de grande importância
quando do segundo conflito mundial.²
As comunicações via-aérea com a
Europa e a América do Norte vêm ganhar impulso após 1942, quando os Estados
Unidos declaram guerra à Alemanha, em 22 de agosto daquele ano. O Recife
possuía, então, uma população de 348.424 habitantes, passando assim a abrigar
as bases militares norte-americanas. Na Base Aérea do Ibura aterrissavam os
catalinas e as chamadas fortalezas-voadoras (B 29), enquanto no seu porto
permaneciam ancorados modernos porta- aviões, cruzadores, destroiers das forças
aliadas.
As comunicações por via aérea do
Recife para a Europa e a América do Norte vêm a ganhar impulso após 1942,
quando os Estados Unidos declaram guerra à Alemanha, em 22 de agosto daquele
ano. Terminada a guerra, em 9 de maio de 1945, a Base Aérea do Recife passa,
também, a servir de pouso obrigatório às aeronaves civis, oriundas da Europa,
até a construção do moderno Aeroporto Internacional dos Guararapes, inaugurado
em 18 de junho de 1958 pelo então presidente da República, Juscelino Kubitschek
de Oliveira.
O Aeroporto dos Guararapes vem a
ser totalmente modificado, com novas instalações e aumento de sua pista para
3.500 metros, em 10 de novembro de 1982, a fim de atender à demanda dos
modernos aviões – Jumbo, DC 10, Airbus. Após 18 anos de utilização, a pista foi
ampliada e está sendo construída uma nova estação de passageiros.
O aeroporto do Recife tem a
denominação de Guararapes em virtude das duas batalhas (1648 e 1649) travadas
nas colinas vizinhas. O sucesso obtido pelas tropas luso-brasileiras veio
selar, de forma definitiva, a reconquista do território ocupado pelos
holandeses entre 1630 e 1654.
Notas do autor:
1 - Em 1981, quando da reforma do
sistema viário da Praça da Encruzilhada, foi a coluna demolida, dela restando
tão somente a águia, modelada em cimento, sobre um pedestal mais parecido com
um bolo de noiva. Isso, depois de protestos dos leitores do Diario de Pernambuco,
na coluna “Cartas à Redação”, iniciado por Napoleão Barroso Braga (DP,
31.10.1981) e sequenciado por Gerson Cariry (DP, 2.12.1981), Rubem Franca (DP,
9.5.1982), Carmelo Vilela (DP, 23.11.1982), dentre outros. – Em 1999, o
monumento veio a ser restaurado pelo prefeito Roberto Magalhães Melo, que para
isso utilizou os serviços do artista plástico Jobson Figueiredo.
2 - BRAGA, Napoleão Barroso.
Cartas recifenses. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1985. p. 94.
Do Diario de Pernambuco
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